“Para o lugar da velha sociedade burguesa com as suas classes e oposições de classes entra uma associação em que o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos”. In Manifesto do Partido Comunista
I
A busca de justiça, de igualdade, de bem estar para todos, esteve sempre presente em toda a história da humanidade.
Por acção de tantas e tantas lutas de classe, foram os avanços revolucionários, e não os recuos, alguns monstruosos, que marcaram a dinâmica da roda da História, que hoje, tantos insistem em fazer voltar para trás.
Leia-se o Manifesto. “[Homem] livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, burgueses de corporação e oficial, em suma opressores e oprimidos, estiveram em constante oposição uns aos outros, travaram uma luta que, de cada vez, acabou por uma reconfiguração revolucionária de toda a sociedade ou pelo declínio comum das classes em luta”.
Se isto é verdade, poder-se-á questionar, vendo nesta evolução apenas uma dinâmica mecânica, automática para que é necessária uma teoria revolucionária. Que falta faz o Marxismo-Leninismo à emancipação social – aspiração de sempre dos povos?
II
Legado de Marx e Engels, enriquecido por Lénine com os ensinamentos do movimento operário e comunista nas primeiras décadas do século XX, particularmente na Rússia, e com as análises das novas facetas do capitalismo na sua fase imperialista de desenvolvimento, o marxismo-leninismo, ao qual se deve a descoberta de que a luta de classes tinha sido, até aí, o motor de todas as transformações e, principalmente, que assim continuaria a ser daí para a frente, é hoje, contra ventos e marés, para uma boa parte da população do planeta, a referência maior para a sua acção.
Perenidade que confirma a tese de que as ideias, quando penetram nas massas organizadas, tornam-se força material, como aliás bem prova a força que hoje tem o ideal comunista pelo facto de milhões de homens e mulheres o terem tomado como seu, em todo o mundo.
É que os princípios do marxismo-leninismo constituem o instrumento indispensável para a análise científica da realidade, dos novos fenómenos e da evolução social, um sistema de teorias que explicam o mundo, mas que não se limitam a isso, pois indicam como transformá-lo. Ideologia dialéctica, necessariamente avessa quer à sua dogmatização, à sua utilização como cartilha ou receituário prêt-à-porter, quer à sua revisão oportunista e reformista social-democratizante, ao sabor das modas e marés.
Marxismo-Leninismo cujas fontes se encontram na notável síntese de Álvaro Cunhal, no plano da “filosofia, no materialismo-dialéctico, tendo no materialismo histórico a sua aplicação à sociedade”; no plano da “economia política, na análise e explicação do capitalismo e da exploração, cuja “pedra angular” é a teoria da mais-valia”; na “teoria do socialismo, na definição de uma sociedade nova com a abolição da exploração do homem pelo homem”.
Ideologia Marxista-Leninista que é uma concepção materialista e dialéctica do mundo, instrumento científico de análise da realidade, guia para a acção que, em ligação com a prática, se enriquece e renova com o incessante progresso dos conhecimentos e experiências.
III
O Marxismo Leninismo faz falta ao caminho da emancipação social dos trabalhadores e dos povos de todo o mundo, exactamente porque desvendou que a contradição fundamental no capitalismo é a que resulta da contradição entre trabalho e capital, a contradição inerente ao modo de produção capitalista entre o carácter social da produção e a apropriação privada da riqueza criada e, nessa sequência, que “os proletários nada têm a perder a não ser as suas cadeias. Têm um mundo a ganhar”.
Mas também descortinou que para construir a sociedade nova que os povos perseguem, «ela [a classe operária, e os povos do mundo] não tem utopias prontas a introduzir [por decreto]. Sabe que, para realizar a sua própria emancipação – e com ela essa forma superior para a qual tende irresistivelmente a sociedade presente pela sua própria actividade económica – terá de passar por longas lutas, por uma série de processos históricos que transformam circunstâncias e homens. Não tem de realizar ideais mas libertar os elementos da sociedade nova de que está grávida a própria velha sociedade burguesa em colapso».
Para se assegurar o caminho da emancipação social, o marxismo-leninismo afirma um conjunto de ideais centrais:
1. À classe operária, exactamente porque nada tem a perder, está cometido o papel central na luta contra um sistema caduco, irracional, injusto e tanto mais perigoso quanto se acentuam as suas contradições e se aproxima o seu fim. “A classe operária, pelo seu lugar no processo produtivo, por estar no centro da luta entre o trabalho e o capital, pelo grau de organização e experiência de luta, continua a ser a força dinamizadora e mobilizadora das lutas de classe”. No nosso país, continua sendo a força impulsionadora da vasta frente social de luta pela ruptura com a política de direita, pela política patriótica e de esquerda, pela democracia avançava que coloque os valores de Abril no futuro de Portugal.
2. Tendo presente a experiência histórica da Comuna de Paris, a classe operária, sozinha, não conseguirá alcançar o poder e construir a sociedade nova, precisando de assentar a sua acção em alianças sociais básicas. Como escreveu o camarada Aurélio Santos, num artigo sobre a Comuna de Paris, “As forças motrizes [da transformação social] são as classes, grupos e camadas sociais que nela participam e o seu sucesso depende, em larga medida, das alianças que possam criar-lhe uma base social de apoio para o desencadeamento e sustentação do processo revolucionário”. Assim, a aliança com o campesinato, força social interessada em abolir as relações de domínio dos grandes latifundários e agrários é um elemento central. Mas também as alianças que ganham crescente importância, na exacta medida do seu peso social, com a intelectualidade, com a pequena e média burguesia, e tem de contar também com o apoio da juventude, e das mulheres.
3. Decorrente da anterior, a emancipação da classe operária, com o fim da exploração, representará não apenas a sua própria emancipação, mas a emancipação de todas as classes e camadas antimonopolistas. Derrotado o capitalismo, na sua fase imperialista, libertos os povos do jugo opressor, destruídos os monopólios, o novo poder revolucionário concretizará uma política no interesse de todas essas classes e camadas.
Têm a ganhar os camponeses pobres e a agricultura familiar que terão acesso à terra de que precisam para produzir e cujo esforço será valorizado pelo escoamento a preços justos da sua produção. Os pequenos e médios comerciantes e industriais, que poderão desenvolver as suas actividades livremente, sem o peso esmagador dos grandes grupos económicos e financeiros. Os intelectuais que verão a sua contribuição e criatividade valorizadas e a cultura colocada ao serviço de todos. Os jovens a quem será garantido um presente e um futuro com educação, emprego, direitos e paz. As mulheres cuja discriminação será abolida. Ganha mesmo cada nação, na medida em que a supressão da exploração dos indivíduos, é condição para a supressão da exploração das nações umas pelas outras.
4. Para alcançar a emancipação total é indispensável assegurar a propriedade colectiva dos meios de produção. Enquanto a regra social vigente for a apropriação, por parte de alguns, do trabalho realizado por muitos, essa emancipação não será possível, pois o movimento é sempre feito no interesse de uma minoria. Com a propriedade colectiva, o esforço de cada um é para o bem geral, a riqueza criada é riqueza para todos. Por outro lado, como a vida vem demonstrando, a natureza autofágica, parasitária do capitalismo constitui-se hoje já como uma barreira ao desenvolvimento harmonioso de todas as economias.
5. Para assegurar a total emancipação social dos trabalhadores e dos povos, a eliminação de todas as formas de exploração e dominação do Homem pelo Homem exige a superação revolucionária do capitalismo, e qualquer tentativa para o humanizar estará completamente votada ao fracasso. Reformistas social-democratas, oportunistas de direita e de esquerda, velhas e novas organizações têm proposto modernizar as relações sociais no capitalismo e assegurar uma menor injustiça relativa na distribuição da riqueza. Mas tal não resolve o problema central do capitalismo, onde se aprofunda “o abismo entre um punhado de multimilionários insolentes e que se afogam na imundice e no luxo, por um lado, e milhões de trabalhadores que vivem constantemente na fronteira da miséria, por outro”, e cuja gula e voracidade pela concentração da riqueza não tem limites assim como não tem limites a criatividade para agravar a exploração e concretizar os seus projectos de domínio mundial.
6. Para assegurar a superação revolucionária do capitalismo, não bastam as condições objectivas, são também necessárias as condições subjectivas, designadamente a existência de um forte Partido Comunista, com uma sólida teoria revolucionária, um Partido Proletário de Novo Tipo, como o definiu Lénine, independente dos interesses, da ideologia e do poder da burguesia, capaz de organizar e conduzir as massas, de enquadrar as condições objectivas para a luta revolucionária, enriquecido pela força do «grande colectivo partidário», expressão consagrada estatutariamente pelo PCP, que «traduz a participação, a intervenção e a contribuição constante dos colectivos, a busca constante da opinião, da iniciativa, da actividade e da criatividade de todos e de cada um, a convergência das ideias, dos esforços, do trabalho das organizações e militantes no resultado comum».
7. Como Marx demonstrou, a existência das classes está apenas ligada a determinadas fases de desenvolvimento histórico da produção; sendo que a luta das classes conduz necessariamente à “ditadura do proletariado” (essa forma superior de poder democrático da maioria para a maioria, cuja contraposição com a democracia da burguesia é uma falsidade, porque esta, sim, é a imposição dos interesses de uma minoria, a burguesia, sobre todas as outras classes e camadas) e que ela só constitui a transição para a superação de todas as classes e para uma sociedade sem classes, momento da total emancipação social.
IV
Camaradas,
Duas palavras apenas sobre o que trouxe à emancipação social dos trabalhadores e dos povos o maior acontecimento do século XX, senão de toda a história da luta da humanidade.
A primeira para sublinhar que lá, nas longínquas terras da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e no conjunto dos países do sistema socialista, se foi tão longe quanto teria sido possível na emancipação da classe operária, dos trabalhadores e dos povos.
Sim. Tão longe quanto foi possível, nos escassos 70 anos da sua experiência histórica, nas condições concretas do seu desenvolvimento, partindo de um patamar tão baixo como o que ali existia, perante o mais intenso e refinado cerco que se pode imaginar.
A assumpção pelos trabalhadores, pela primeira vez na história da humanidade, do poder efectivo, debaixo da consigna “todo o poder aos sovietes de operários, camponeses e soldados”; a garantia dos direitos sociais; a erradicação da fome, da miséria, do desemprego; a generalização da escolaridade e da educação superior; a espantosa evolução da ciência e da técnica; a universalização do direito à cultura e ao desporto; o carácter pioneiro dos direitos das mulheres, da juventude e das crianças; a valorização do papel dos intelectuais; a garantia do direito à terra para quem a queria trabalhar; o derrube do sistema colonial e a consagração dos direitos nacionais dos povos, constituem aspectos centrais dessa emancipação, que não são desmentidos pela degradação do carácter popular do poder, que foi substituído por um poder centralizado e afastado das aspirações, opinião e vontade do povo.
A segunda para lembrar que o poder do exemplo desses povos emancipados foi tão forte, tão novo, tão marcante, que não apenas chegou a todos os cantos do planeta como favoreceu a luta e a conquista de direitos em todos os países do mundo.
V
Três notas finais.
Separar Lenine de Marx, negar o primeiro para valorizar o segundo ou partes do segundo significa, de facto, renegar os dois. Lénine não é o prático de Marx e Engels. Lenine é o aprofundamento do marxismo. É o próprio marxismo desenvolvido, reflectido, testado pela experiência e a vida posteriores, assim como o Marxismo-Leninismo é hoje isso tudo com os contributos valiosos de todos os revolucionários e dos seus Partidos, incluindo o nosso.
A experiência não vitoriosa da Comuna de Paris confirmou a tese central do Marxismo-Leninismo de que cada sistema económico transporta consigo os germes da sua própria destruição, o que a Revolução Socialista de Outubro, reconfirmou, inaugurando a época histórica da passagem do capitalismo ao socialismo, na qual nos encontramos.
Os erros, os desvios, as traições, que se somaram à brutal ofensiva a que a União Soviética esteve sujeita, e que usou os mais poderosos meios políticos, económicos, militares e ideológicos, não apagam nem o brilho da contribuição que ela deu para se concretizar um passo em frente na emancipação social, nem as ricas experiências que provam que essa emancipação é não só necessária como possível e que dela é o futuro da humanidade.